O pai procurou a Justiça com um pedido de exoneração de pensão alimentícia. O filho, agora com 19 anos, havia atingido a maioridade, estava inclusive no serviço militar obrigatorio, a obrigação legal de pensionamento parecia estar chegando ao fim. No papel, tratava-se de uma petição simples. Na realidade, era o capítulo mais recente de uma história marcada por afastamento, desencontros e ausência de convivência.
Quando o processo foi encaminhado para mediação, ambos aceitaram comparecer — com resistências, receios e expectativas baixas, isso era evidente no inicio da fala dos mediandos. Nenhum deles imaginava que ali começaria uma transformação.
A Escuta que Desarma
Na sessão de mediação, não se falou apenas de valores ou obrigações legais. Se deu a palavra e a escuta e nisso falou-se de ausência, de mágoas, de como o filho cresceu sentindo-se rejeitado, de como o pai se afastou por não saber como se aproximar, e por ter se sentido, ele também, excluído da vida do filho. Em um ambiente seguro, com a mediação conduzida com empatia e neutralidade, ambos puderam dizer o que nunca haviam dito — e ouvir o que nunca tinham escutado.
Foi nesse momento que algo mudou. As barreiras emocionais começaram a se desfazer e isso foi palpável a mim como mediadora e se alguem ali tivesse ouvindo sentiria o mesmo. O silêncio, que antes servia como muro entre os dois, deu lugar a palavras que abriram espaço para algo novo: reconhecimento. Foram duas horas de muita escuta e falas importantes.
Muito Além da Exoneração
Sim, ao final, um acordo sobre a pensão foi firmado. A exoneração foi aceita, dentro do que a lei permite, com o filho já maior de idade. Mas o mais importante não estava no papel. Antes de saírem da mediação, pai e filho decidiram trocar contatos. Combinaram para dias depois, tomarem um café. Pela primeira vez em anos, iriam conversar fora de um contexto de obrigação legal. Eles riram juntos, e planejaram uma vida em que ambos estavam pela primeira vez incluidos.
A mediação não forçou um afeto — ela apenas abriu caminho para que ele pudesse existir.
A Emoção da Reaproximação
O que se viu, nesse caso, foi a materialização da potência emocional da mediação. Quando as pessoas têm a oportunidade de se ver como seres humanos, não apenas como partes opostas de um processo, algo genuíno pode acontecer. O filho, ao se sentir ouvido e respeitado, pôde baixar a guarda, e ele expressou a saudade e falta que o pai lhe fez durante a vida. O pai, ao reconhecer sua ausência e acolher as dores do filho, pôde se aproximar com humildade.
Ambos saíram transformados. E a emoção que acompanhou essa transformação foi silenciosa, mas profunda: uma mistura de alívio, gratidão e esperança.
Conclusão: Quando o Direito Encontra a Humanidade
A mediação, especialmente no campo familiar,que confesso ser minha paixão, tem um poder que vai muito além da resolução de demandas jurídicas. Ela é capaz de restaurar vínculos, de resgatar afetos e de permitir que o passado seja, ao menos em parte, reconciliado.
Neste caso de exoneração de pensão, o verdadeiro ganho foi intangível: pai e filho se reencontraram como pessoas, com tudo o que isso implica — dor, afeto, imperfeições e possibilidades. E essa emoção, nascida em um espaço de escuta e respeito, é talvez o mais poderoso fruto que a mediação pode oferecer.